Cuidar da saúde mental vem se tornando tão importante quanto cuidar da saúde física, especialmente entre crianças e adolescentes. O tema foi incluído pela primeira vez em 2021 pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) no Tratado de Pediatria, a principal publicação destinada a médicos que cuidam da saúde de pessoas com até 18 anos no país. Ainda no mesmo ano, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), em parceria com o instituto Gallup, publicou o relatório Situação Mundial da Infância 2021. Na minha mente: promovendo, protegendo e cuidando da saúde mental das crianças, também elegendo a temática como prioridade de atuação.
Os dados levantados pela pesquisa da Unicef servem de alerta: pelo menos uma em cada sete crianças e jovens de dez a 19 anos convive com algum transtorno mental diagnosticado no mundo. Além disso, cerca de 46 adolescentes morrem por suicídio a cada ano no mundo, uma das cinco principais causas de morte nessa faixa etária. Em crianças e adolescentes, os casos mais comuns quando falamos de saúde mental são: depressão, transtornos de ansiedade, transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), transtorno por uso de substâncias e transtorno de conduta.
O psicólogo, psicanalista e professor do curso de Psicologia da Escola de Ciências da Saúde e da Vida Jefferson Silva Krug, destaca que comportamentos como birra e falta de atenção devem ser considerados em seu poder comunicativo, ou seja, podem indicar que alguma experiência emocional da criança necessita ser avaliada para melhor auxiliá-la. O apoio emocional, principalmente quando ofertado pelos pais, é fundamental para conseguir encontrar um diagnóstico o mais rápido possível.
“Muitas vezes os pais e responsáveis acabam passando muitos anos sem nenhum tipo de orientação e auxílio para o estabelecimento dessa escuta de comunicação entre o que a criança está demonstrando e aquilo que eles conseguem enxergar e acabam tendo medidas de cuidado que podem não ser as mais adequadas – e isso sim pode levar a pioras de quadros emocionais e relacionais também.”
Antes de tudo, é preciso prestar atenção aos sinais que crianças e adolescentes podem apresentar quando estão com a saúde mental debilitada. Os mais novos não conseguem se expressar como os adultos, por isso, é importante atentar aos sinais. Entre esses sinais podem estar, por exemplo, mudanças de comportamento e humor, dificuldade de concentração, perda ou ganho de peso repentino, vontade de se auto machucar e emoções intensas, como um medo excessivo de morrer e dores físicas. Em adolescentes, também vale a recomendação de cuidar se há vontade excessiva de usar álcool e drogas, além de comportamentos de isolamento social.
O aumento do número de diagnósticos de crianças com diferentes transtornos mentais pode assustar, mas para Jefferson, a preocupação deveria ser em como ajudar crianças e adolescentes a lidarem com essa condição. Evitar estereotipar doenças e transtornos mentais e fazer uma divulgação correta sobre quais emoções podem ser vividas durante a experiência infantil e adolescente pode ser um bom começo, que pode ajudar não só os pais, mas também as crianças e adolescentes a buscarem ajuda.
“É preciso orientar os pais a respeito de como cuidar das crianças e dos adolescentes, abrindo espaços para diálogos dentro da família e também em espaços privados, como os atendimentos psicoterápicos. Também é preciso um esclarecimento acerca das possibilidades e benefícios que uma psicoterapia e uma análise com crianças e adolescentes podem trazer para toda a família. E esclarecer também o que elas podem trazer para o desenvolvimento emocional daquela criança ou daquele adolescente e da família como um todo.”
Além do acompanhamento médico, há algumas ações que podem ajudar na prevenção de suicídios e outros problemas relacionados à saúde mental. Segundo a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e o Hospital Albert Einsten, essas ações, além de diminuir fatores de risco, também podem aumentar a qualidade de vida de crianças e adolescentes.
Relações afetivas com o círculo familiar, ambiente aberto ao diálogo e escuta ativa, praticar atividades prazerosas como ler ou ir ao cinema e também estabelecer uma rotina para diversas atividades. Uma boa alimentação, alinhada a uma boa noite de sono e exercícios físicos regulares também são fundamentais. Tanto a ABP como o Albert Einsten reforçam que crianças e adolescentes também precisam ir ao médico regularmente, além de aprender a administrar emoções.
O psicanalista ainda alerta que, antes de tudo, pais e responsáveis precisam escutar as crianças e adolescentes.
“Não existe uma receita a ser usada de maneira idêntica para todas as crianças. Estamos acostumados a educar dizendo o que elas devem fazer, mas precisamos aprender a ouvi-las e ajudá-las a formular suas percepções sobre si mesmas, auxiliá-las a buscar um sentido para o que estão sentindo. E a partir disso, ajudar as crianças e adolescentes a terem essas experiências e seguir investindo nisso”, finaliza Jefferson.
Fonte: https://www.pucrs.br/